sábado, 30 de janeiro de 2010

DESPEDIDAS

Por que relutamos tanto em nos despedirmos? Maldito apego. E nem sempre adianta, na hora do aperto no peito e o do nó na garganta, rezar ou pedir a Buda sabedoria e desapego para contemplar a transitoriedade da vida. A gente quer sempre o imortal, a eternidade, a imutabilidade.

Sou péssimo com despedidas. Mas adoro uma ceninha na rodoviária. Com revistas e maçãs. Bem Caio F. Seja quando vou ou quando fico. Parece que a saudade é mais verdadeira e a ausência mais real. Auto-flagelação talvez. Sou bem latininho: Dramático, emotivo, sentimental.

O difícil no momento do adeus é o caminho do meio. É a cisão entre o que fica e o que vai. Magicamente esperamos que a dor passe, tentamos exaurir essa dor que destrói o peito. E não adianta fazer o forte, o indiferente. Lá vem a saudade bater na cara da gente. Tentamos enganar a dor, ludibriar a morte. Bom seria se conseguíssemos sempre travar um jogo de xadrez com a morte, como em O Sétimo Selo, do Bergman. E vencer, claro. Ou que a vida fosse como na música Fantasia, do Chico: “E se, de repente / A gente não sentisse / A dor que a gente finge / E sente / Se, de repente / A gente distraísse / O ferro do suplício / Ao som de uma canção”.

É preciso deixar algo para trás para se ter outras coisas. Não podemos estar em todos os lugares ao mesmo tempo e o tempo todo, ter todas as coisas e todas as pessoas sempre. A carga precisa ser diminuída de vez enquando. Esvazia a mala para seguir adiante.

Mas é bom poder voltar. Rever carinhos, guardar memórias e visitá-las para aquecer o coração. Tento sempre semear carinhos pelo caminho. Como uma trilha de migalhas de pão. Vou, mas refaço o trajeto de volta para casa. E me alimento desses carinhos que deixo. Semeio, rego, tento manter tudo bonitinho. E venho, de tempos em tempos, para ver crescer o que plantei. Às vezes algumas sementes nem chegam a germinar, outras morrem antes de crescerem. Mas é a lei da vida também.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

A VIDA É FEITA DE ESCOLHAS

Ja falei isso antes, não gosto de ter que fazer escolhas. Ainda menos escolhas definitivas. Não gosto sequer de ter que escolher. É angustiante. Nunca tenho certeza se a camisa preta é melhor que a branca, que o restaurante japonês é melhor que o italiano, se a praia é melhor que a serra, se namorar é melhor que ficar sozinho. Mas respiro fundo e mentalizo, como um mantra: “decide e segue em frente sem olhar para trás”. Com camisas, destinos de viagens e restaurantes é mais fácil. E quando é preciso escolher se caso ou compro uma bicicleta? Sou piegas, sempre quero casar, embora bicicletas, às vezes, sejam o melhor negócio. Não por carência, vivo bem sozinho. Arrumo a mesa para um sem maiores sofrimentos. Mas ter a casa cheia é melhor.

Penso que sentimos esse desconforto quando somos obrigados e escolher porque temos a memória de quando éramos crianças e o mundo era tudo o que quiséssemos. Bastava uma manha, um chorinho, um pedido lacrimejante entre beiços e pronto. O mundo era menos complicado também. Onde foi que perdemos a simplicidade infantil? No mundo dos adultos não podemos ter tudo ao mesmo tempo. Pior, não podemos nem querer tudo ao mesmo tempo. Porque no mundo dos adultos, diferente do universo infantil, se escolhemos uma coisa temos que abrir mão de outra. Adultos não podem dizer que querem sushi e spaghetti ao sugo na mesma refeição. As crianças amamentadas no peito podem sugar um seio e segurar o outro com a mão. Mais que um gesto de aconchego e carinho, é uma forma de demarcar seu território, determinar que possuem ambos os seios, a mãe inteira é delas. Às crianças é permitido o egoísmo sem limites. Quando crescemos, temos que mamar em apenas um seio e abandonar o outro.

Quando escolhemos um caminho, estamos fadados a não saber nunca mais como seria se tivéssemos escolhido o outro. Claro, só tenho esses pensamentos quando alguma coisa dá errado no caminho que escolhi. Se está tudo bem, tudo sob controle, posso estufar o peito e me sentir “o cara”. Porém, meus caminhos nem sempre são os mais seguros e tranquilos. Na verdade, quase nunca. Escolho as lombadas pedregosas, as curvas sinuosas, os túneis escuros. Várias vezes caminhei até chegar ao fim da estrada pedregosa e tive abrir picada com a mão. Não, não gosto de viver perigosamente, sempre procuro aquela estradinha retinha e lisinha, com uma paisagem bonita e um solzinho leve. Mas o que posso fazer se o que quero é difícil de conseguir?

Comentava com amigos que o bom de viver com dificuldades é que a gente aprende na dor, cresce com os sofrimentos e valoriza muito mais cada vitória. Cada golpe que dei para abrir caminho me mostrou que sempre se pode ir adiante. E é deliciosa a sensação de derrubar uma muralha e ver o que tem do outro lado. Sem arrependimentos.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O MOMENTO DO ADEUS: SEQUÊNCIA FINAL


Seria mais romântico se o encontro fosse numa estação do metrô em Londres ou Nova York. Luvas, mantas e botas. Mas o provável cenário é um apartamento de quarto e sala em um grande condomínio qualquer em pleno verão dos trópicos. Assim ocorre a cena:

Fade in: Plano médio. Ambos sentados frente a frente, um em um sofá confortável, cercado almofadas, outro em uma cadeira de madeira antiga, com braços, com aspecto gasto e seco como tudo que os cercava, mas que ainda guardava um certo ar imponente. Olhares distantes, respiração alterada. Um leve vento sopra, balançando a cortina translúcida e o amuleto chinês - que dizem trazer sorte e boas energias - na janela, tilintando delicadamente. É noite alta e somente a luz de um abajour ilumina seus rostos cansados e sulcados do tempo e do sofrimento de estarem juntos ou separados. Seus olhares se encontram, furtivos. (Ouve-se piano lento, melancólico – “Evening In Atlantis”, Esbjörn Svensson Trio ou “In The Upper Room, Dance VII”, Philip Glass). Do plano médio dos perfiis de ambos, há um corte para o rosto do que está sentado na cadeira. O mais falante e inquieto, provavelmente. Visivelmente incomodado com o silêncio, pergunta ao outro, que supostamente acabara de chegar, o que o leva até aquele momento, enterrado naquele sofá entre almofadas velhas. Corte para um plano fechado no rosto do outro. Close up nos olhos negros e úmidos, de uma tristeza dilacerante. A respiração dele fica ofegante, sua voz falha. Tenta recompor-se. Titubeante, não diz nada. Estava selada a despedida.

Quanto mais tentavam falar, mais surdos e mudos se tornavam um ao outro. A incomunicação era tamanha que quando um abria a boca para ratificar o que o outro dizia, este se insurgia, corrigindo seu interlocutor. Mais que discutirem o conteúdo do que queriam expressar, ativeram-se à forma do que era dito e linguisticamete o que cada um dizia. A amargura que sentiam em seus corações e em suas bocas, misturada à incompreensão de cada um sobre os mistérios que envolviam o outro e a si próprios escorria pelas paredes da minúscula sala, brotava do chão e do teto, e os envolvia como um manto denso, leitoso, nauseante e doloroso.

Sentiam tanto medo de pronunciar palavras que dessem um ponto final a tudo o que haviam tentado em vão construir juntos que seus silêncios tornavam-se cada vez maiores. Não havia raiva, apenas desânimo e derrota. Embora não tivessem tanta certeza que havia chegado o fim, precisavam dizer que havia acabado de vez, que seus sonhos haviam naufragado num mar calmo e cristalino. Não teriam sequer a desculpa de um mar revolto cheio de monstros de mil tentáculos e calypsos. Por isso, por não haver raiva, mas uma dor profunda e mansa que fez morada, aos poucos, no peito de cada um, que não conseguiram crer no insólito que era ver que tudo o que quiseram construir havia virado um monte de destroços à deriva. Dizer adeus seria consolidar tacitamente que haviam sido incompetentes e suas infelicidades estariam, em última instância, confirmadas.

Talvez existisse, no fim, um sentimento terno e doce, que queriam guardar. Talvez não quisessem esgotar esse resquício de amor, ou seja lá o nome que quisessem dar a essa ternura profunda, para lutar para trazer à tona o restante do pouco de proa conseguiam avistar no mar tranquilo. Talvez cada um quisesse usar essa força que sentiam ainda pulsar como bote para que pudessem chegar à praia deserta mais próxima e salvarem a si próprios.

Fade out: Deitados de costas na areia, suspiram aliviados e olham, com o mesmo olhar perdido,  para o céu infinitamente azul, que encontrava o mar não menos azul, e pensam em dizer para si próprios, como uma prece, que mesmo exaustos ainda estão vivos. Embora absolutamente sozinhos. Abrem os olhos e nada mudou. Continuam na mesma sala, vendo um inseto chocar-se contra a lâmpada do abajour.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

CAFÉ É DE DEUS...


Nunca canso de dizer: uma boa xícara de café preto e bem forte é uma das melhores coisas do mundo! Café estimula, acalma, acompanha. Quando estou sozinho, uma caneca de café (porque sou super pão-com-ovo e mega exagerado, não sei tomar cafezinho) senta ao meu lado na frente do computador ou num canto qualquer onde esteja. Passei tardes inteiras de solidão – sozinho ou dois – com um uma xícara em riste. O aroma, o calor e o sabor me abraçam. Eu bebo café com a urgência e veemência de quem ama pela primeira vez. Café é uma religião para mim. Bebo quando saio da cama, porque não acordo antes de beber café (às vezes nem depois, mesmo quando saí da cama), após as refeições, para comemorar, para afogar as mágoas, para distrair, como um ritual de aproximação de outra pessoa ou para me manter afastado de todos. Café faz parte do meu ritual de fuga da dor. Cerco-me de coisas que me confortam, incluindo, além de café, pantufas e mantas, canções, poesias, incensos e chocolates.

Uma piada interna entre alguns de meus amigos é que costumava, quando eu ainda tinha algum traquejo para isso, “laçar” minhas conquistas amorosas com café preto e Billie Holiday. Quando sabiam que eu tinha algum encontro (e muitas vezes teve torcida organizada) no dia seguinte o código que indicava a vitória da conquista brotava, como um troféu, entre um sorriso satisfeito: “Rolou café e Billie Holiday!”. Café é um bom subterfúgio para distrair o nervosismo das mãos quando a insegurança e a falta de jeito criam barreiras para tocar com os dedos o que com os olhos, poros e pensamentos já vasculhamos intensamente. E  Billie Holiday, para completara cena,  preencheu, com aquela voz levemente melancólica e aqueles solos de sax arrastados, os espaços vazios de assunto. Às vezes funcionava. Em outras evidentemente não. Sempre tinha quem não bebia café ou não ouvia jazz. Ou ambos. Com criatividade encontrava, de vez enquando, um plano “B”.

Costumo sentar em alguma cafeteria qualquer para escrever, para ler, para pensar na vida. Um gole de café magicamente me traz à tona e me faz ver o mundo melhor. Como se pudesse ficar mais alto e ver tudo mais de cima - outro sonho impossível de realizar que fomentarei em vão ao longo da vida, aqui, do alto dos meus eternos “um-metro-e-sessenta-e-bem-poucos”.

Durante um longo período tomei meu sagrado expresso de depois do almoço na mesma cafeteria do centro, acompanhado de uma fidelíssima e amadíssima alma-irmã. Não sei o que será do futuro. Em outros pagos, logo logo, meus dopo pranzo serão mais tristes. Um pedaço da minha alma fica, mas o gosto daqueles cafés lúdicos e líricos vão me acompanhar por onde eu for.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

PRENÚNCIO DO FIM

Tenho o péssimo hábito de achar que nada é bem como eu estou pensando. Eu me engano fácil. Iludo-me com maestria. Uma amiga sempre cita um filme, um tratado sobre desilusões e confusões amorosas. É a bíblia dela. E eu adoro. Sempre penso que ser rejeitado não é assim como eu vejo e sinto. Afinal, sou imaturo às vezes, sou inseguro quase sempre. Não ligou no dia seguinte? E se o celular caiu num rio durante uma trilha de 500km pelo Rio Amazonas? Celular desligado? O sinal pode simplesmente estar ruim em Dakar ou no Sri Lanka. Mas estamos na mesma cidade, melhor pensar em outra alternativa. Deixo umas mensagens para lembrar que estou aqui. Do tipo: “ops, estava aqui fazendo palavras cruzadas e lembre de ti, por isso liguei”. Se for sem retorno, sempre dou uma chance ao imprevisto. Tem gente que não tem o hábito de retornar ligações, ouvir mensagens, ler e-mails. Sim, talvez espere receber um fora nos sete meios de comunicação mais utilizados. Sou um pouco Stalker. Refazer trajetos, procurar pistas. Minha amiga, ácida, sempre lasca: “Isso significa que não está afim de ti.”

O pior é que essas inseguranças não existem somente no começo de relacionamentos ou quando relacionamentos ainda nem começaram. Em relações mais longas (bem mais longas) também tendo a ser maleável, flexível e compreensivo. Uma monja. Só que tem o meu maldito lado tsunami, que também aflora nessas crises de insuficiência de mim.

Fecho os olhos. Respiro. Concentro. Mentalizo. Pro escambau com esse lance de ser centrado! Faço barraco no minuto seguinte. Conto até dez e antes do onze já falei tudo o que penso. E sou verborrágico. Arrependo-me, peço perdão. Às vezes é tarde. As pessoas cansam também.

Não existe coisa pior que insistir quando não se acredita mais. Reanimar um cadáver é muito triste. Sentimento de luto, de perda, de derrota. Pior que a morte física é a morte do sonho, dos planos, dos desejos. Arrancar do peito a ilusão e sepultar com uma pedra o sonho. Mesmo que seja para dar lugar a outro no futuro. Tento escavar com as mãos o mais fundo que posso e descobrir o que existe nas camadas mais profundas. Grandiloquente. E muitas vezes ineficaz. O que a gente faz quando acredita que existe amor lá no fundo, quando ainda temos esperanças de existirem sobreviventes sob os escombros, mas as equipes de resgate já encerraram as buscas? Nem sempre há tesouros enterrados sob uma montanha de realidade dura e fria.

Transmutação. Impermanência. Evaporação. Sim, sentimentos evaporam como éter. Ouvi uma pessoa comentar que tudo no mundo é dinâmico, nada é estático. Só que o tempo do planeta é lento. As mudanças demoram séculos, milênios, mas tudo está sempre em movimento. Temos a sensação da permanência e da estática porque nosso tempo aqui é muito curto. Não é a Terra que não se move, é a gente que dura pouco. Ser poeira cósmica pode ser tranqüilizador. Se tudo muda e estamos sob o júdice dessas forças, seria bom e reconfortante conseguirmos relaxar e deixar fluir, seguir o fluxo da correnteza como um barquinho. Mas acho que não. Acho que a vida espera mais de nós.

MÍNIMOS MÚLTIPLOS

Não sei se lido bem com negativas. Acho, porém, que hoje melhor que antes. Mas mexer com meus brios pode ser uma péssima ideia. O pior de mim aflora. Viro Bette Davis. Baby Jane Hudson perde feio! Desejos de vingança com os requintes de crueldade mais absurdos passam pela minha mente. De fato, nunca concretizaria nenhum dos pensamentos que tenho. Eles servem apensas para serem pensados e posteriormente esquecidos. É uma espécie de catarse. Preciso pensar para exaurir, para purificar meu coração. E os pensamentos homicidas desaparecem da forma como surgem.

Sou possessivo. Sou neurótico. Sou dramático. Misturar italianos, sírios, libaneses e espanhóis não podia dar boa coisa mesmo. Mas terapia ajuda a controlar os monstros indomados. Pelo menos deveria. Sou do tipo manso, na maior parte do tempo. Reconheço meus limites, respeito os sinais. Ouço a sabedoria do meu corpo. Não contemplo os abismos muito de perto. Mas não me furto de uma ceninha para dizer que estou aqui e a que vim.

Uma vez fui diagnosticado como sendo portador (sei lá se é assim que se diz) de personalidades múltiplas, entre outras pérolas. Na hora achei fantástica a idéia de ser vários, embora tenha ficado arrasado por menos normal que eu suspeitava. Nunca fui muito bom com escolhas e ser múltiplos de mim mesmo poderia ser bem interessante. Eu poderia ser o que quisesse simultaneamente, sem os pudores dos sensatos. Não sei nem escolher uma música, um livro ou um filme prediletos. Por isso seria uma péssima Miss. Ia querer salvar as baleias e as crianças do Haiti no mesmo programa social, citaria Sartre, Nietzsche, Freud, Sade e Saint-Exupery numa única citação separada por ponto e vírgula, teria pelo menos quatro pratos prediletos e cinco músicas que tocam o coração, além de levar uma comitiva para uma ilha deserta. Isso não significa que sou volúvel. Sou absurdamente fiel ao que amo. Mas amo muitas coisas ao mesmo tempo. Claro, não me refiro a pessoas. Quer dizer, não a relacionamentos afetivo-sexuais, namoros e afins. Não que essas dúvidas nunca tenham acontecido nesse campo...Ai, to me complicando!

Voltando, vestir a cara que mais agrada no momento era uma idéia que eu gostava muito. Evidentemente, isso virou um tormento logo depois da descoberta. Não podia ser diferente. Não existe coisa pior no mundo que ser diagnosticado de algo que não se é por alguém que o é. Explico: ouvi a coisa errada da pessoa errada. Caí nas graças de uma psicóloga, se é que realmente era, completamente transtornada. Vejo hoje o poder destrutivo da mente sobre outras mentes. Águas passadas. Hoje sei que não tenho personalidades múltiplas. Nem eu.

QUEM DISSE QUE VIVER SERIA FÁCIL?


Eu já ouvi repetidas vezes: “Mas vai ser difícil! Não vai ser fácil mesmo...”. Que disparate! Desistimos antes de começar. Sempre esperamos que as coisas sejam fáceis e existam na hora certa, no momento previsto, conforme o planejado. E de preferência com plano de execução e projeto prévio, protocolado e carimbado no universo para não restar dúvidas que a carta de navegação funcionará impecavelmente. Esquecemos que a vida é o devir, é o imprevisto, o inesperado, a hora não marcada, o momento errado.

O que nos torna humanos, e o que nos torna humanos melhores, é nossa capacidade de nos reinventarmos, de superarmos as adversidades. Parece papinho de auto-ajuda. Ta bom, não é sem dor, lembro os sofredores de plantão. Viver é sofrer também. Mas nada de fatalismo. Nascer é sofrimento, morrer é sofrimento. Só que no meio disso existem coisas bonitas. Não sou um deus por dizer isso. Quem vive sabe bem o que digo. Alerto: viver é mais que acordar todas as manhãs e olhar a cara inchada no espelho antes de urinar e tomar banho, é mais que comer nos horários certos e trabalhar oito horas por dia mecanicamente. Viver é subverter a ordem, é olhar para o alto e querer voar. É conseguir voar sem sair do lugar. Viver é amar sem medidas, loucamente. Seja uma pessoa, uma idéia, um bar, uma rua, um livro, uma cama, uma ausência, um dia, um minuto, um gesto, um esquecimento.

Neuroticamente busco esse tal recheio do sanduíche de sofrimento que é viver. Muitas vezes esbarrei com pessoas e situações inacreditáveis. Em outras dei, não menos inacreditavelmente, com a cara na porta. Mas me reinvento a cada tropeço. Teimosia? Provavelmente. Penso sempre que é melhor o cansaço da derrota após o embate do que o cansaço pela fuga em disparada.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

NO DIA EM QUE EU VIM-ME EMBORA


Também não teve nada demais. Cheguei de mala (que não era de couro forrada com um pano forte brim cáqui), sem cuia, o peito cheio de ansiedade. Noite alta, rua escura, coração meio apertado. Os barulhos de dentro abafando os silêncios de fora. O som seco da mala arrastada pelas pedras gastas de tão antigas. O som rascante do coração pulsando no peito.

Pensei comigo: nada de grande acontecerá. Nem aconteceria. Afinal, era somente mais um no bando chegando ou saindo. O caminho de milhares agora sendo trilhado por mim. Tudo bem, em sentido oposto. Sou às avessas. Todos saindo e eu chegando. Mas é a vida. Sem glamour. Talvez não sem dor. Isso também já estava sendo esperado.

Podia até ser cena de filme. Filme de segunda, meio noir. Mocinho chega, jeans apertado, Ray-ban, jaqueta de couro. Desce do ônibus com sua bota tilintando, cigarro entre os lábios ressecados. A fumaça dançando até o céu. A câmera fecha nos pés e sobe lentamente pelo corpo até fechar nos olhos negros e levemente marejados sob os óculos escuros. Somente o som do vento, a poeira na estrada e a solidão. Ninguém esperando na plataforma, sem comitiva de boas vindas. Não, também não foi assim. Foi mais real, verdadeiro e lírico. E bonito. Talvez precisasse ir para longe encontrar o que está mais dentro. E fui o mais longe que pude para ir o mais dentro que consegui.

Serão dias sem muito sol, sem muito calor, bem sei. Porém, talvez sejam os dias mais verdadeiros que já tive. No fim das contas, isso me enche de alegrias e esperanças. Como diria o bom e velho Caio: “Que seja doce”.

DIVAGAÇÕES E CONFISSÕES...


Deveria ser um post de boas vindas. Mas não sei se sou muito bom com essas formalidades. Digo a que vim (se é que vim com finalidade específica): este espaço serve como um alterego, um confessionário, um divã, como olhar nos meus olhos em frente ao espelho do banheiro enquanto escovo os dentes pela manhã.
Fomento a tempos o desejo de expressar meus pensamentos, semear minhas idéias, ou polinizar o que sinto pelos caminhos tortuosos desta rede. O tom confessional e um pouco formal da minha fala agora vai ser gradativamente relaxado, na medida que eu me sentir mais relaxado em postar aqui.
Sou virgem. Confesso, sou virgem. Virgem de blogs, virgem de escrever coisas publicáveis. Mas estou disposto a exercitar. Ja tive diários, cadernetas e caderninhos para pensar em voz alta. Mas nunca em voz tão alta quando agora. Mas tudo na vida é disciplina, vontade e hábito, por fim. Então, que seja.
Espero que minha jornada seja acompanhada.