Dizem que nossa memória mais intensa é a olfativa. Minha memória olfativa é dos cheiros da minha infância: O cheirinho do pão da minha avó, aquecido na chapa do fogão à lenha na pequena cozinha da humilde casa onde viviam duas das pessoas que mais amo na vida. Aquele cheiro de manteiga caseira era delicioso e quando recordo imediatamente me vem à boca o sabor que aquela tempo tinha. Lembro com saudades do cheiro da comida da minha avó e da mãe, que são cozinheiras espetaculares.
Minha mãe é uma midas da culinária. De pouco mais que nada ela prepara pratos de deixar os paladares mais apurados estupefatos. Ela avisa de longe que está por perto através do cheiro do que prepara. É cheiro de lar, de aconchego, de carinho. Ela tem outros diversos dons. Realmente ela é boa em tudo o que faz, não estou exagerando. E na cozinha ela é imbatível. Provavelmente porque cozinha com um prazer invejável. O carinho que imprime em alimentar quem é importante para ela (e até mesmo as visitas indesejadas dos fins de semana) é o ingrediente mais importante.
A cozinha é minha parte preferida da casa. Nos saudosos e intermináveis almoços de domingo na casa dos meus pais, fartamente servidos, depois de nos esbaldarmos com as delícias preparadas pela mãe, o que mais adoro é ficar sentado à mesa, conversando fiado com todo mundo despreocupadamente, até vasculhar o que a geladeira guarda para a sobremesa, para depois mergulhar lânguido no sofá da sala.
Penso que herdei o gosto em transformar ingredientes diversos em carinhos. Sei que não tenho o mesmo dom, mas o prazer em afagar com alimentos os que me são caros sim. E vou contar um segredo: não sou lá essas coisas na cozinha, mas sou metido, como em quase tudo que faço. Mas faço com gosto e adoro conquistar as pessoas pelo paladar. Em empenho nos detalhes, nos cheiros, nos sabores, nas cores, nas texturas, no equilíbrio de tudo que envolve a apresentação.
Prazer. Não somente para cozinhar, mas para tudo na vida. Esse é o segredo. Se quisermos que algo dê certo, temos que fazer com gosto, colocar em tudo o que temos de melhor. Como na poesia do Pessoa: “Para ser grande, Sê inteiro / Põe o quanto és no mínimo que fazes”.
Os relacionamentos que temos ao longo da vida, sejam quais forem, são mais ou menos assim. A gente tenta equilibrar sentimentos para obtermos uma relação que encha os olhos, com todos os cheiros, cores e sabores do amor. Mas para isso é preciso certo dom e muito treinamento também. Sou meio desmedido, tanto na cozinha com nos meus relacionamentos. Exagero no sal, no ciúme, na pimenta, na possessividade, no açúcar, nas exigências infundadas. Talvez devesse pegar com minha mãe umas dicas de como equilibrar os temperos da vida.
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