terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

UM CERTO Sir PARSIFAL

Quando penso nos encontros que a vida pode me proporcionar lembro sempre da lenda de Parsifal, “o inocente casto”, e da sua busca pelo Cálice Sagrado. Na mitologia medieval, uma das explicações é que este cálice sagrado, o Santo Graal, teria ficado sob a tutela dos cavaleiros conhecidos como Templários, uma espécie de instituição militar e religiosa que tinha por missão proteger as conquistas das cruzadas e os peregrinos na Terra Santa. Na literatura medieval, a busca pelo cálice representava a tentativa do cavaleiro pela perfeição.

Do ponto de vista místico, a busca pelo Graal representa a busca por uma vida superior, por progresso espiritual. Nas lendas arturianas, com seus cavaleiros da Távola, só é possivel às pessoas de coração puro e isentas de pecado ver e tocar o cálice. O caminho do Graal está unido à idéia de um sacrifício e de uma viagem cheia de perigos para alcançar a iluminação, o renascimento ou a "vida eterna", segundo os cristãos. O início e o final da busca pelo Santo Graal são, por isso mesmo, momentos cruciais, pois é uma busca que não termina. O Graal tem que ser constantemente buscado no coração, na mente e no espírito. Sua revelação final representa aquele ideal de subida aos planos superiores de existência, objetivo máximo de todos os místicos. Ao entrar em comunhão consigo mesmo, se descobre não uma melancolia, mas um parceiro interno, uma relação que se assemelha à alegria de um amor secreto.

Existem outras histórias, que relacionam o cálice ao útero, sendo a representação do feminino e do vazio que engloba tudo, ao passo que a espada do cavaleiro representa a força masculina. Mas a idéia da busca pela perfeição e pelo autoconhecimento me agradam sobremaneira. Mesmo que autoconhecimento seja um mito contemporâneo, uma quase lenda urbana com matrizes socráticas. Mas isso é outro assunto. Obstinadamente busco em todas as esquinas e becos da vida o tal “cálice”. Busco dentro e fora de mim, como numa caçada insana pelo tesouro perdido.

Acho que somos todos meio Parsifal, meio cavaleiros medievais, enfrentando cruzadas inimagináveis em nome de um ideal e obsessivamente buscando a perfeição, buscando saciar um desejo em um objeto quase sagrado. Mesmo os mais céticos e cisudos buscam, mesmo que secretamente, aquele friozinho na barriga, aquele suor nas mãos, a palpitação, pupilas e papilas dilatadas e pernas trêmulas.

Admitam: todos gostam de um cafuné, de um cheiro no pescoço, do conforto do aconchego, de sentir aquela sensação estranha e deliciosa no plexo solar, aquele “frio na boca do estômago”. Eu adoro. Vivo disso, me alimento dessas sensações, tento reproduzi-las sempre que posso. Assumo que sou obsecado. Sou um Parsifal neurastênico, um Templário obsessivo e transtornado. Mas não tem coisa melhor na vida que ficar na cama o dia todo num domingo chuvoso, de pijama, cabelo em desalinho e cara amassada, com um chameguinho sem pressa, despreocupado, despretencioso. Ou aquele carinho terno, aquele amor brando e breve no fim da tarde, de permas pro ar sobre o tapete da sala, após um cansativo dia de trabalho. Aquele momento breve como um suspiro, que dura somente até o sol se por e a vida voltar ao (a)normal. Aquele encontro mágico e inesperado, quando não estamos devidamente vestidos, devidamente perfumados, devidamente preparados, porque, embora busquemos ávidamente, nunca estamos preparados para o amor.

Como um caveleiro do Rei Arthur, trato de manter meu reino, defendo com todas as forças minha ordem, fiel escudeiro que sou. Enfrento o que for preciso em nome do que acredito, mesmo aderindo a batalhas difíceis de vencer. Sou meio Lancelot, que mesmo sabendo que minha Rainha Guinevere é inviável eu tento, arrisco meu pescoço em nome do que sinto. Apesar de correr o risco de ser expulso, levo a cabo o que sinto. E exilado não me arrependo. Ainda que com minha lança sem fio, minha armadura enferrujada, cansado de tudo, enquanto eu acreditar em minhas próprias causas, luto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Diga o que pensa...