sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

SABER A HORA DE MUDAR DE RUMO

“Foi
Fica um gole de mim no café que restou
Mais amargo que frio, tens razão
...
Onde o meu coração desandou a bater
E onde a minha ilusão se desfez
...
Tua fria mudez me chamou à razão
Na dureza da luz me joguei”
                                        

(Adriana Maciel, Fórmica Blue)


O mais triste e sintomático do fim de uma relação é a perda da intimidade. Me pergunto como pode alguém que conheceu o mais íntimo, o mais profundo do pior de mim e ainda assim permaneceu, que disse, com olhos molhados e brilhantes que me amava, virar um completo estranho. É como quando a gente dança e se desconcentra ou desvia a atenção, quando falseia o passo. É a perda do jeito.


Quando termina, fica a saudade, o gole amargo do fim. Pode ficar mágoa e ressentimento também. Só que mágoa e ressentimento é ainda são formas de saudade do que perdemos. É sentir uma fisgada no membro amputado. Bem Chico. Metade cindida, perdida no caminho. Foi, mas ainda dói. Paradoxalmente, mais sofrido que a dor excruciante da perda da metade é ver que a dor está passando, a ferida parou de sangrar, a cicatriz está ficando cada vez mais imperceptível. Nesse momento surge uma dorzinha funda, mansa, contemplativa. Ver que a vida continuou. Dói saber que aqueles olhos brilhantes que faziam juras e iluminavam a escuridão da vida da gente agora podem iluminar outros caminhos. Mas dói também saber que o coração da gente parou de bater acelerado, as mãos não mais suam frias, as pernas não ficam mais trêmulas, não existem mais planos para o futuro, viagens, morar juntos, comprar um cão, redecorar a casa, decidir o jantar. Dói sentir que viver sozinho pode ser bom e é um bom caminho, afinal.


Acho que sofro mais quando percebo que eu não amo mais que quando percebo que não sou mais amado. Porque me dilacero fácil por amor e me reconstruo da mesma forma. Quem não quis um dia ser como aqueles andróides do filme O Exterminador do Futuro? Estraçalhados com uma bazuca, se liquidificam e se reconstróem dos escombros. Indestrutíveis. Não, não sou indestrutível. Mas adoraria. E tirando aquela cena em que o Exterminador diz no balcão do bar “fale com esta mão”, não admiro em nada a obra.


Chega uma hora que a gente começa a ver tudo com um certo estranhamento. Um olhar de estrangeiro. Tenho percebido em mim esse olhar de estrangeiro para praticamente tudo ultimamente. Até quando lanço um olhar sobre mim mesmo. Caminhando pelas ruas largas e arborizadas desta cidade, de paralelepípedos desgastados, com casario de porta na calçada e povo brejeiro, tenho pensado nessa estranheza e distanciamento. Como pode aquele serzinho que encaixava tão bem na gente na hora de dormir de conchinha ter se tornado o pior dos travesseiros de hotel vagabundo. Impossível ter uma boa noite de sono.


Não sei se tenho problemas ou sou tão bem resolvido que consigo superar todas as pedreiras da vida uma hora ou outra. O fato é que quando me desligo emocionalmente é definitivo. Não consigo mais ser como antes. Posso até continuar sendo companheiro, consigo viver ainda ao lado de quem amo, mas o amor nunca é o mesmo. Quando acaba definitivamente, porém, eu tendo a seguir meu rumo. “I want to be Alone”. Bem Greta Garbo em Grand Hotel. E raríssimas vezes me demovi da ideia de continuar em frente quando vejo que não há nada que valha a pena. Inteiro entro, inteiro saio. Se continuo tentando é porque ainda não mudei o rumo da embarcação.

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