quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

AO ENTARDECER

Fins de tarde me despertam sensações diversas. Às vezes alegria, às vezes tristeza, às vezes ambas. Poderia ser mais um fim de tarde qualquer, não fosse o inesperado da situação. Surpresa. Estupefação. Momentos inesperados são sempre os melhores, ser pego de surpresa por algo que, embora desejado, não era planejado.

É verão ainda, mas o fim de tarde trouxe um vento levemente frio. Gosto de dias assim, ensolarados e frios, embora não tenha enfrentado o minuano rascante desta terra no inverno. Gosto também de entardeceres meio melancólicos que parecem querer me fazer chorar.

O sol foi ficando mais fraco e alaranjado, inundando de dourado a vegetação rasteira, a qual era possível acompanhar pela planície que se fundia no horizonte com um céu profundamente azul salpicado de nuvens. Gosto dos fins de tarde da fronteira como gosto de fronteiras. E o engraçado é que estar na fronteira me leva à fronteira, inváriavel e inexoravelmente. Fins de tarde são limiares, o exato momento em que sentimos alívio e pesar pelo dia que se foi e pela noite que chega, aquele angustiante momento fronteiriço em que não sabemos se é dia ou noite, se está anoitecendo ou amanhecendo, onde as formas ficam difusas e os olhos precisam de certo tempo para se acostumarem à ausência de luz e identificarem novamente quaisquer formas. É como se o tempo parasse naqueles segundos de transição, como se tudo, inclusive eu mesmo, nos fundíssemos em uma coisa só, indefinida, difusa, gigantesca e assustadora. Senti-me por alguns momentos imerso nessas sensações amorfas, nem boas, nem ruins.

Pensava nisso vendo um sol de fogo se por entre nuvens cor violeta, que sobrepunham um céu extremamente azul. De amarelo ouro foi descendo cada vez mais alaranjado atrás da coxilha verde que ia ficando vez mais dourada. E esse dourado foi invadindo tudo em volta, inclusive a mim, até sumir no horizonte, deixando no chão somente um tom azul cobalto levemente mais claro que o azul escuro no qual o céu se transformara. A terra encontrava o céu no horizonte, parecendo um só azul matizado, rajado pelo verde da vegetação rasteira e pelas nuvens róseas e violáceas.

Sentado em um banco localizado em um patamar levemente mais alto que o restante do lugar, que formava uma espécie de mirante, cercado de verde, com o céu e a coxilha à frente e uma igrejinha pequena e belíssima em estilo que lembra o barroco açoriano na retaguarda, bebendo chimarrão (ao melhor estilo destes pagos), perdi meu olhar na imensidão branda e árida do pampa. Somente conseguia ouvir os silêncios, contemplados segundo a segundo, entre um gole e outro. Silêncios e solidão compartilhados amainaram dores e foi inevitável relembrar o passado, repensar o presente e sonhar com o futuro.

Poderei recordar para sempre desse dia: ao entardecer contemplei, do alto de um mirante, meus escombros. Foi um momento raro, mágico, terno. Observei cada nuance que pude com carinho. Sentia apenas um vazio imenso, sem tristeza, apenas ausência de tudo, uma vastidão interior que encontrava outra vastidão. E nessa comunhão de infinitos particulares tentei respirar o mais profundamente que pude, tentei ampliar meus sentidos ao máximo para conseguir absorver a realidade sendo redescoberta naquele momento. E comecei a compreender de outra forma o sentido de existir e os desígnios do universo. E vi que não há como fugir do que ele reserva para mim.

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